Conto Publicado no livro MARCAS DA VIDA 2004 ®

                      O Portão do tempo

 

   N

aquela cidade pequena e pobre existia um garoto que nunca aceitava ver seus pais passar tanta necessidade, no entanto ele também passava, pois não tinha os devidos movimentos das pernas.

            Mas ele sonhava e sonhava alto. Seus pensamentos alçavam vôos altos, mas tão alto que um dia um de seus sonhos tornou-se realidade.

            Através de um aparelho de televisão o pequeno garoto transformou uma passagem no tempo. Havia conseguido quase sem querer, não sabia direito o que havia feito e logo chamou seus pais para verem sua engenhoca. Admirados de seu pequeno filho, ainda lhe incentivaram sem saber o que o futuro lhe reservava.

            O pequeno garoto chamou a pequena máquina de PORTÃO e seu portão funcionava de verdade, tanto é que viajou para o passado há uns quinhentos anos do presente e descobriu o porquê não movimentava as pernas, então aceitou o que o destino havia lhe reservado.

            Viu a vida de seus pais e cada vez mais entendia o porquê de tudo, o porquê da vida ser assim. Sabia agora porque algumas pessoas sofriam mais que outras, ou porque eram ricas e felizes.

            Então começou a brincar de ser Deus e a opinar na vida de todos pela sua região. Era ele quem indicava desde o Prefeito até o delegado e todo o povoado o elevou como um Deus.

            Passou a fazer previsões para todos aqueles que o procurava, entre tudo, ele era totalmente respeitado por todos.                                

            Anos depois recebeu a visita dos Presidentes desde os Estados Unidos até o Presidente do mais miserável País do mundo, no entanto fez uma previsão.

            Aquela previsão deixou muito irritado o Presidente americano que se calou e não quis falar do assunto.

            O mundo ficou apreensivo, o mundo queria saber o que o pequeno guru havia dito, foi aí que todo o segredo fora revelado. "Uma pequena nação dentro  de alguns meses dominará o mundo e o mundo passará fome. Todas as outras nações serão serviçais dessa pequena nação".

            O planeta ficou chocado com tal revelação, então chamada a cúpula da ONU para reunião fechada. Assim ficaram confinados dentro de uma sala durante cinco dias e logo que saíram à imprensa estava na porta para saber o motivo da reunião e nada foi dito.

            Os aliados mandaram aviões de combate e dois generais disseram "Matem o pequeno guru, pois é ele quem quer dominar o planeta com seus poderes podres, não permitam que sobreviva nenhuma célula dele... tragam-no morto."

            E assim foi feito, mataram o pequeno guru. Foi sepultado no mar, dentro de um caixão de chumbo para não vazar nada dele para o mar, assim havia sido.

            Mas, jamais entenderam a carta que ele havia deixado para a civilização, que era mais ou menos assim...

            "Tenho sede de ordem, sede de paz, não sou eu quem quer dominar o mundo mais, uma injustiça farão e assim nunca mais a civilização conhecerá a verdadeira paz mundial. Não sou Deus como o mundo me chamou, mas sou filho dele, assim como todos vocês são. E foi ele que me gloriou com o saber, com o amor e com a paz. Infelizmente depois da injustiça feita, jamais terão paz".

            Numa folha de papel, aquelas haviam sido as últimas palavras do pequeno guru.

            Hoje o planeta Terra não tem mais verde e a água secou, tudo aconteceu por causa de uma bomba que explodiu sozinha.

            O pouco de água que resta é suja e o homem mata outro homem para roubá-la e tomar.

            O planeta é rochoso e quente, não existe mais frio como contam os antigos. Alguns dizem que a lenda do pequeno guru é verdadeira, e se assim for, quanta saudade daquele tempo que não vivemos.

 

 

 

 

 

 

 

 

Conto extraído do livro Marcas da Vida - 2004
Conto extraído do livro Marcas da Vida - 2004

                            Marcas da Vida

 


Teresa era a mulher mais linda dos passados anos oitenta. Ainda criança não conseguia entender a realidade dura que seria a vida, então o tempo passou e a adolescência chegou.

E junto da adolescência conheceu o amor com o garoto que lhe amava. Fazia tudo por ela aquele garoto que jurou um dia amá-la eternamente.

Cumprindo sua palavra chegaram ao noivado que um mês depois fora desmanchado por causa de um desemprego, que assolou a vida dele. E por estar desempregado Teresa pediu-lhe um tempo no romance.

E o tempo passou, agora ele já não era mais um garoto e sim um tremendo rapaz, alto, forte e bonito. Tinha ele muitas qualidades então procurou novamente Teresa que já havia arrumado outro namorado. Esse rico e de família importante, havia até a colocado na empresa dele.

Após um ano Teresa ficou grávida e procurou pelo antigo namorado e mostrando-se muito nervosa pelo fato de o namorado não querer assumir o filho, pediu ao antigo namorado para voltar.

Como ele amava demais Teresa aceitou-a de volta. Mas por algum problema no terceiro mês, ela perdeu a criança e assim desimpedida voltou aos braços cifrônicos do riquinho.

Hoje estou com setenta anos e Teresa com sessenta e nove. Eu estou sozinho, pois fiquei viúvo e não tive filhos. Teresa também não teve filhos, depois daquele perdeu mais dois e teve que operar, sendo assim, jamais poderia ser mãe.

Mesmo sozinho, sou feliz. Não tenho muito dinheiro, tenho minha casinha humilde, mas estou sempre indo aos bailes da terceira idade e sei como aproveitar o pouco tempo que tenho.

Teresa está tão velha quanto eu. E nem todo o dinheiro que ela possui pode comprar sua juventude e nem tampouco sua felicidade. Já não suporta mais o marido doente na cama. Passa o dia todo se olhando para o espelho e relembra, talvez, de como poderia estar feliz ao meu lado. Mas escolheu a vida farta de dinheiro, dinheiro que nunca comprou e nunca vai comprar o amor que senti por ela.

Ela é apenas uma senhora frustrada e espera que seu fim chegue logo, porque o espelho não tem poder para transformar pessoas... apenas o tempo tem o poder de transformar e nem mesmo o tempo conseguiu transformar o meu amor por ela.

 

 

Uma Xícara de Ciúmes

 

 Quando Humberto chegou em casa a esposa já estava preparando o jantar, porem com a cara fechada e brava.

— O que houve? Algum problema no serviço? – perguntou ele.

— Não aconteceu nada no trabalho.

— Então o que houve? Por que essa cara?

— Ai, é tua ex-mulher que ligou varias vezes querendo falar com você. Tava tão nervosa que disse que vai passar aqui amanhã.

— É. Mas não disse o que queria?

— Não.

Jantaram calados. Ele foi para sala ver algum programa de tv antes de ir para cama.Vanessa nem olhava para ele, mas sabia que Humberto não tinha culpa de nada. Homem trabalhador, honesto e responsável.

E num desses programas de entrevistas cotidianos uma banda tocou uma música que fez com que eles lembrassem instantaneamente do primeiro beijo... de repente trocaram olhares. Ela o olhou mordiscando a ponta do dedo e sorrindo.

Logo acabaram na cama numa noite intensa de amor.

Acordaram por volta das sete horas da manhã. Ela já atrasada para o trabalho, então ele adiantou o café, passou margarina no pão, aqueceu o leite e preparou a xícara para que a esposa tomasse rapidamente o desjejum.

Vanessa trabalhava como secretária numa empresa em expansão. Era de confiança do patrão.

Humberto um taxista que levava uma vida dura. Pagava pensão pra ex-mulher e pra filha, a prestação do carro, as contas da casa, as despesas do lar... Tudo corria por conta dele.

Vanessa assumiu apenas a prestação da casa própria, era só o que seu salário conseguia pagar. Ainda meio estranha por causa da ex-mulher resolveu provocar Humberto e se vestiu de maneira que despertasse certo ciúme no marido.

— Ué. Por que vai assim hoje?

— Ué, por que você faz tantas perguntas pra mim? Faz algumas pra sua ex. Como por exemplo: Você ainda me ama. Por isso me procura tanto?

— Não sei por que você ta fazendo isso. Sabe que ela é assim e também sabe que ela fica pendurada no meu pescoço. É uma parasita da pensão!

— Sério? Se você não me falasse nem ia desconfiar.

Mas Vanessa pra não dar muita satisfação e nem prolongar a discussão, apanhou a xícara colocou café deu um gole em seguida acendeu um cigarro, deu uns dois tragos... Retocou o batom... Deu mais um trago e o apagou em seguida.

— Até mais. E divirta-se com a ex.

E rapidamente saiu.

Humberto irritado foi atrás dela. Ainda meio durona entrou no seu táxi e foi calada da porta de casa até seu trabalho, não trocou sequer uma palavra com o marido que disparava perguntas, mas ela não lhe dava resposta alguma. Dali Humberto seguiu trabalhando e por volta do meio dia passou na casa da ex-mulher resolveu a pendência com ela e voltou ao trabalho. Vendo que a vida de um taxista é muito difícil rodou até as quinze horas sem obter nenhum resultado significativo, ou seja, o dia estava sendo muito difícil. Parou num bar, almoçou fumou seu cigarro como sempre fazia após o almoço e quando estava pensando em ir para casa tirar uma soneca para continuar no começo da noite chega um rapaz e pede seu serviço.

— Pode me levar em Mogi Mirim?

— Claro.

Ao entrar no carro tentou ligar para a mulher que não atendeu seu telefonema, então seguiu viagem.

Já anoitecia quando Vanessa chegou em casa e pensou em fazer lhe uma surpresa bem romântica. Só que ao entrar na cozinha viu em cima da mesa a xícara com marca de batom, um cigarro apagado pelo meio também com marca de batom... ficou intrigada com aquilo e ao entrar no quarto notou que a cama estava ainda desarrumada.

— Canalha! Bastou uma discussão para ele se deitar com a ex. Mas ele me paga, espera só ele chegar. – Esbravejava Vanessa.

Ela apanhou uma mala e arrumou com algumas peças de roupa e alguns pertences pessoais e sentou-se no sofá esperando Humberto voltar.

Por volta da vinte uma horas ele chegou e viu aquela mala arrumada e sem entender nada perguntou:

— Por que essa mala?

— Humberto... Cansei. Bastou um desentendimento pra tudo acontecer.

— Acontecer o quê?

— O quê? De quem é essa marca de batom na xícara e na ponta de cigarro? E a cama desarrumada?

— É sua.

— Como minha se eu não fumo, Humberto?

— Lembra que você se embelezou toda pra ir pro trabalho? Então, nem o café que eu preparei você aceitou. Preferiu passar aquele batom vermelho que eu detesto e pra completar ainda acendeu um cigarro. Habito que você não tem. E pra que? Só pra me fazer sentir ciúme de você?

Quando decidi morar contigo não escondi que já havia sido casado e que minha ex-mulher era um porre. No entanto você me aceitou mesmo assim com todos meus defeitos e minhas qualidades, só que de repente você muda a regra do jogo no meio do segundo tempo e resolve ter crises de ciúme querendo que eu me sinta constrangido com sua atitude. Isso tudo ainda ta ai por que não deu tempo de tirar, pois corri atrás de você pra te levar no trabalho para que não chegasse atrasada. Eu só penso no seu bem estar e você tem pensado no meu?

Vanessa debruçada com os cotovelos no joelho e as mãos espalmadas no rosto disse: — Ta. Chega!

Levantou-se do sofá caminhou em direção ao marido e beijou sua boca como um pedido de perdão e ali mesmo começaram a se despir e terminaram no quarto para uma longa noite de amor.

 

Moral: O ciúme faz com que criemos nossos próprios fantasmas e quase sempre nos assustamos com nossas criações.

Conto Publicado no livro MARCAS DA VIDA 2004 ®

Memórias de um Cachorro

  

            Nasci numa cria de seis filhotes, fui o quinto a nascer. Uma de minhas irmãs não resistiu e morreu após o quarto dia de vida.

            Nossa, como era bonita a minha mãe, uma cadela branca, mas sem raça alguma. A dona da minha mãe, uma mulher rabugenta, implicava comigo e com meus irmãos e já não agüentando mais com a bagunça que a gente fazia resolveu nos dar. Meus irmãos não sei pra onde foram, só sei que quem me acolheu foi uma senhora de bastante idade.

            Aos dois meses fui separado de meus irmãos e da minha mãe. Primeiro órfão de pai, pai que nunca conheci, agora órfão de mãe e irmãos, Oh meu Deus! Quanta tristeza!

            Dona Martha que passou a cuidar de mim, apesar de muita idade era uma boa pessoa. Ela me fazia uma comida super gostosa, dava-me banho, fazia-me carinho e de noite dava-me para beber leite morno. Era ela mesmo que preparava.

            Eu dormia no sofá da sala e com tanta hospitalidade que tornei-me o cachorro mais feliz da vizinhança.

            Todas as manhãs, Dona Martha passeava comigo, a gente ia à padaria, ao açougue e, de vez em quando, à farmácia.

            Após algum tempo fiquei amigo do gato do sr. Manoel, o dono da farmácia. Confesso, nunca vi ninguém tão desconfiado como meu amigo "o gato", eu já havia lhe prometido minha total amizade e a gente se tornou bons amigos, mas nada dele confiar em mim. Pois num cachorro um gato não confia. Foi o que disse Lili, uma linda cadela do bairro. Ela era toda cinza, usava nas orelhas fitas rosas que seu dono o sr. Alberto dizia dar sorte.

            Cresci forte, com saúde. Também, de tempos em tempos, Dona Martha me levava em uma mulher para tomar  injeção, ainda dizia que era para meu bem. Para meu bem era tomar leite morno e ver todos os dias a Lili.

            O dia havia amanhecido bonito demais para um simples dia de banho rotineiro, e foi nesse dia que tudo aconteceu.

            Dona Martha naquele dia não acordou, quer dizer, ela nunca mais acordou; ela passava a viver agora em minhas lembranças.

            Somente depois de dois dias é que encontraram Dona Martha, pois eu latia muito e chorava ao lado dela, mas ela nunca mais acordou.

            Começou então o meu sofrimento, fui viver minha vida de cachorro, não tive escolha alguma. Fui parar na rua e ao primeiro passo pedi ajuda ao meu amigo gato, em vão. Recorri a Lili, e seu riquíssimo dono me enxotou.

            Eu, agora, não tinha mais comida e nem água, comecei a emagrecer, meus pêlos ficaram duros e sujos, as pulgas me perturbavam muito durante à noite e durante o dia também.

            Tentei retornar a minha antiga casa, mas o tempo tirou certas imagens de minha cabeça, não consegui mais lembrar de minhas origens.

            Carrego comigo muitas pulgas e a lembrança da minha mãe e irmãos, dos amigos, o gato e a linda Lili; até da saudosa Dona Martha que fez de mim o cachorro mais feliz de uma época.

            Sofro as agressões do tempo, vou pelas ruas fuçando os lixos para sobreviver, os papelões são minha pousada. Tenho o mundo todo para caminhar e tentar encontrar alguém que me acolha, ou então, que me mande de vez ao paraíso dos cães, pois deste mundo estou cansado. Esta é a verdadeira história de um cachorro vira-lata, não colocarei meu nome para evitar mais transtornos nessa minha vida de cachorro.

 

 

                                   

 

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